Atualizar conhecimentos para gerar futuro

09/11/22
Atualizar conhecimentos para gerar futuro

"Continuem a apostar na formação e atualização, pois só deste modo se gera futuro", afirma a Dr.ª Helena Catarino, dirigindo-se aos participantes do XV Congresso Nacional da Associação Portuguesa de Farmacêuticos Hospitalares (APFH). A presidente do Congresso faz jus ao lema deste encontro, que arranca amanhã, 10 de novembro, no Convento do Beato, em Lisboa. Em entrevista, aborda aspetos relacionados com o evento, mas também particularidades da profissão e dos profissionais.

News Farma (NF) | Atendendo ao lema desta edição do Congresso Nacional da APFH – “Somar Conhecimento, Gerar Futuro” – poderia indicar de que forma os farmacêuticos hospitalares têm gerado futuro para a própria profissão?

Dr.ª Helena Catarino (HC) | A nível hospitalar, o papel do farmacêutico tem evoluído de forma notável ao longo das últimas décadas. Com o desenvolvimento de novos fármacos, a exigência no aprofundamento de conhecimentos em inúmeras áreas, acarretou mais trabalho e responsabilidades.
O farmacêutico hospitalar (FH) tem investido na formação contínua de forma a criar robustas competências, integrando as equipas multidisciplinares nas diversas áreas, acompanhando a inovação e contribuindo de forma eficaz para a criação de valor. É no reconhecimento dessas competências que se alicerça a carreira farmacêutica hospitalar e, neste caso, a formação de um especialista.
O aparecimento e desenvolvimento de novos fármacos e novas tecnologias tem vindo a exigir aos FH uma grande dedicação no estudo e na inovação de como abordar o medicamento de forma a conseguir que este, cada vez mais, chegue de uma forma segura, conscienciosa e dirigida à pessoa que dele necessita; permitindo cumprir a sua missão na otimização das terapêuticas e, consequentemente diminuir o desperdício orientando o portfólio e orçamento, que tem ao seu dispor, em prol da pessoa doente e com verdadeiros ganhos em saúde.

 

NF | Quanto à Residência Farmacêutica, em que medida o título de especialista “gera” um melhor futuro na Farmácia Hospitalar enquanto área da Farmácia, no geral?

HC | Retomando o conceito de especialista em Farmácia Hospitalar, ele traduz autonomia e saber, primeiro pelo conhecimento por ele adquirido, depois pela confiança que gera em todos os intervenientes do processo, levando a uma prestação de cuidados farmacêuticos cada vez mais diferenciados e especializados.
Ao longo do período de formação, a aprendizagem adquirida confere não só experiência, como incute o sentido de responsabilidade, garantido a execução das melhores práticas em todos os aspetos da intervenção do farmacêutico no hospital.
Os desafios e as exigências inerentes às suas funções, associados à evolução científica e tecnológica nesta área da saúde, conducente à Farmácia Clínica, pressupõem um grau de know how e maturidade compatível com o título de especialista em Farmácia Hospitalar.
Não nos podemos esquecer que todos os colegas que vão iniciar a Residência Farmacêutica serão tutelados e monitorados por especialistas em Farmácia Hospitalar, que lhes proporcionarão uma formação seguramente sólida e com grande qualidade técnico-científica para que possam, um dia mais tarde, praticarem as melhores práticas, contribuindo assim para o futuro da profissão farmacêutica hospitalar.

 

NF | A formação assume um papel primordial na construção de um futuro mais promissor. Neste campo, a APFH tem sido incansável, proporcionando ao logo de todo o ano eventos. De que forma a APFH influencia os FH a investirem no futuro participando nos cursos que promove?

HC | É extremamente importante a relação que se tem estabelecido entre os colegas FH e a APFH, através de eventos de diversas tipologias e acessos, que pretendem sobretudo garantir a incrementação e estimulação do conhecimento destes profissionais de saúde para o crescente desenvolvimento tecnológico, digital, farmacológico, entre outros. Todas essas iniciativas são amplamente divulgadas junto dos nossos sócios e todos os serviços farmacêuticos hospitalares, promovendo oportunidades de interação e discussão, de forma a esclarecerem temas pertinentes, ou eventualmente controversos, que diariamente são confrontados nas suas Farmácias Hospitalares.
A nossa abordagem tem sido inclusiva e de estabelecimento de pontes de norte a sul e ilhas, convidando sempre colegas a integrarem as diversas iniciativas, que temos vindo a promover, nomeadamente, as redes em áreas específicas de conhecimento, grupos de partilha com vista à formação de colegas, de outros hospitais, em áreas que ainda não estavam implementadas nos seus hospitais, e ainda com a atribuição de Prémios e Bolsas de Estudo, de forma a incentivar o desenvolvimento de novos projetos e estudos.
São realmente inúmeras as abordagens que a APFH tem vindo a promover, para chegar, cada vez mais, não só aos seus associados, mas também aos seus parceiros, para que, de uma forma conjunta, se criarem pontes geradoras de valor.

 

NF | O Congresso Nacional é também uma oportunidade que estes profissionais têm para somar conhecimento e múltiplas áreas, além de ser um espaço de debate e discussão de ideias. Que novos conhecimentos, nomeadamente na área terapêutica, estarão em evidência ao longo do Congresso e que gostaria destacar?

HC | Nesta 15.ª edição do Congresso Nacional APFH são debatidos diversos temas atuais e inovadores, os quais constituem um objetivo desafiante no desempenho do farmacêutico hospitalar.
Value-based healthcare conceito baseado no retorno, em termos de ganhos em saúde, dos recursos investidos em cuidados ao doente, sendo que a designação de Valor pode ter nuances em função da pessoa doente, que se encara como prioridade. Reunir na avaliação o que acontece à pessoa doente no decurso dos cuidados prestados aumenta os conhecimentos dos outcomes, pois entra em linha de conta com todos os serviços que integram o processo de tratamento. Nesta abordagem privilegia-se o envolvimento do doente no processo terapêutico e nos seus próprios resultados clínicos, ao longo do tempo.
A implementação de um plano de monitorização farmacocinética de um medicamento específico é um processo que dá segurança e otimiza o processo terapêutico. Neste contexto do 5-FU, verificamos que ainda podemos atuar no aumento de eficácia do tratamento e reduzir a sua toxicidade, cuja origem está relacionada com a deficiência em dihidropirimidina desidrogenase (DPD).
Na digital health, salienta-se o que a inteligência artificial traz para a prática clínica, bem como resultados da implementação do Noharm.
As terapias avançadas, abordam os conceitos de uma nova classe terapêutica, nomeadamente as terapias génicas e terapias celulares.
A personalização da terapêutica com auxílio da farmacogenética e farmacogenómica, é uma tendência cada vez mais desejada, na seleção de fármacos, para o benefício da pessoa doente, evitando a toxicidade de uma terapêutica mais genérica e muitas vezes sem efeito para a pessoa doente.
As diversas modalidades de intervenção do farmacêutico no âmbito da Farmácia Hospitalar são amplamente expostas no conteúdo do Programa deste Congresso.
Além das intervenções anteriormente descritas, classificaria como fundamentais para o bom desempenho do Farmacêutico Hospitalar, a prática de Farmácia Clínica em todas as áreas de cuidados. Pois só com a implementação esta atividade conseguimos fechar o ciclo de tratamento
No âmbito das sessões satélite, é referido o papel dos testes moleculares nas alterações genéticas em Oncologia, a gestão do doente VIH, a revisão da terapêutica no caso do cancro da mama HER+, novos caminhos em Neurociências e ainda em pharm learning sessons e workshops na abordagem à síndrome do intestino curto, à psoríase, ao melanoma e à fibrose quística.

 

NF | Poderia apontar um grande desafio que os farmacêuticos hospitalares terão no futuro próximo e a médio prazo?

HC | O paradigma da abordagem do conceito de valor, na perspetiva do atual value-based healthcare, é sem dúvida um desafio para o farmacêutico hospitalar; é algo que suscita múltiplas reflexões e que vem alterando profundamente a prática não só do FH, mas de todos os intervenientes no processo de saúde.
Na área da Farmácia Hospitalar, esta abordagem vai muito para além do que tem sido a relação medicamento-doente, deixando de estar especialmente focada no medicamento, passando a estar centrada na pessoa doente e nos resultados obtidos.
Há que pensar no todo, reorganizando os cuidados a prestar, considerando as condições de saúde do doente, enquadrando-o nas opções possíveis, e avaliando os outcomes positivos e negativos, entrando em linha de conta com todos os serviços implicados no processo de tratamento.
Para isso há que definir os modelos de valor, muitas vezes nada consensuais, criar plataformas dinâmicas e novas vias de cuidados, avaliar a utilidade da inteligência artificial neste contexto, tendo sempre em mente que cada pessoa doente tem as suas próprias características físicas, mentais e sociológicas.
Podemos referir outro desafio, não menos importante, que se prende com sustentabilidade, face ao aumento da utilização de medicamentos complexos e de elevado custo.
Tudo isso pode ser englobado no conceito de valor nas diferentes visões de quem o aborda na cadeia de saúde, sem nunca esquecer que este tem como objetivo um processo associado à saúde de uma pessoa, seja no tratamento, manutenção, cura, ou outros processos que tragam “ganhos” à pessoa em causa.

 

NF | E no tocante a desafios, como classifica o desafio de presidir a 15.ª edição do Congresso Nacional da APFH?

HC | Sem dúvida que é um desafio e uma honra presidir a um Congresso Nacional APFH, que tem um longo e prestigiante passado, tanto no que diz respeito às ilustres figuras precursoras deste evento, como ao nível dos temas que têm sido anteriormente abordados e que constituem o somatório de mais de 30 anos de experiências e conhecimentos técnicos e científicos, adquiridos na área da Farmácia Hospitalar, nas suas inúmeras vertentes.
Na verdade, foi esse o significado do título escolhido para esta edição do Congresso “Somar conhecimento, Gerar Futuro”.
Sendo o Congresso Nacional APFH um dos eventos mais participados nesta área, com todos esses ensinamentos, sem dúvida que o atual farmacêutico hospitalar está hoje mais capacitado para gerar inovação num futuro que se avizinha desafiante.

 

NF | Gostaria de deixar uma mensagem aos participantes?

HC | Aos participantes eu diria que continuem a apostar na formação e atualização, pois só deste modo se “gera futuro”.
Que promovam uma a maior colaboração entre os profissionais de diferentes hospitais, partilhando experiências e participando em estudos mais alargados de modo a consolidar modos de atuação, em prol da saúde do doente.
Procurem ter um papel cada vez mais ativo nas áreas da Farmácia Clínica, com maior proximidade de toda a equipa de saúde, por forma a acrescentar valor à reabilitação do doente. Terem consciência de que os nossos abrangentes conhecimentos geram “pontes” que abrem portas ao futuro no seio hospitalar e, consequentemente, sermos maestros e maestrinas, no processo global que está associado ao valor dos medicamentos.

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